quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Doa a quem doer, evolução é fato e matematicamente óbvio – II

evolucao_fato
Diretamente do Scientia est potentia
Por Francisco Quiumento
Entropia
Tenho repetido seguidamente aos criacionistas que chamo de “amadores” que evitem usar o chamado “argumento da segunda lei da termodinâmica”, que é tão infeliz que seu uso é recomendado como a ser evitado por sites criacionistas

Acredito que as últimas contribuições que fiz ao artigo sobre a segunda lei da termodinâmica na Wikipédia encerram o assunto do ponto de vista de contra argumento, mesmo com vandalismos recentes (inclusive tal artigo hoje já ultrapassa neste campo o excelente artigo da Wikipédia em inglês), mas infelizmente, um artigo mais longo sobre o que realmente seja a vida e a evolução sobre o aspecto termodinâmico eu ainda devo a mim mesmo, além, obviamente, de meus leitores.
Aleatoriedade onde ela não existe ou não é total

Igualmente curiosa como insistente, é a argumentação de criacionistas contra os argumentos que seletividade, tal como a seleção natural propicia, ou mesmo a catálise das enzimas sobre a ordenação tanto de aminoácidos nas proteínas quanto na polimerização do RNA ou DNA (que é sua replicação) conduz a um processo ordenado e não caótico, exatamente como aquele que se observa no “teorema do macaco infinito” que mesmo sobre uma base geradora aleatória, por processo seletivo, chega-se a resultados coerentes com o que seja não uma linguagem articulada escrita, mas mesmo literatura, e mais que isso, a própria literatura que se deseja previamente.
Mas dentro deste argumento, como vimos, o processo de polimerização de aminoácidos, o processo de replicação do RNA e do DNA NÃO É completamente aleatório em sua base, sua origem, pois as moléculas só se encadeiam numa determinada ordem e sob determinados mecanismos, logo temos que os criacionistas desprezam tal questão fundamental, e consideram o processo como inteiramente aleatório, e mesmo quando confrontados com resultados “filtrados” coerentes a partir de uma base aleatória, continuam afirmando que tal não pode ser possível.
Desprezam mesmo questões mais fundamentais, como a que átomos e moléculas não se organizam aleatoriamente, como sempre brincamos com a questão de que cloro e sódio não se combinam aleatoriamente, por exemplo em Na2 e Cl3, ou mesmo NaCl2 ou qualquer coisa assim, e sim, sempre quase instantaneamente em NaCl, logo, o Monstro do Espaguete Voador, paródia de uma divindade criadora, a ser respeitada como “teoria criacionista” a também ser ensinada nas escolas, produziu o sal, e viu que era bom.
Igualmente clássico é o argumento, não pelas reações químicas e seus mecanismos, mas por simples propriedades físico-químicas, do óleo e da água, que pelas simples densidade e polaridade se separam, não interessando quanta energia se aplique ao sistema como agitação.
Moléculas também desfazem de maneira simples o argumento tanto da aleatoriedade em suas reações quanto em incapacidade de produzirem estruturas crescentemente complexas, como sempre cito, na banal “família” de reações químicas
H2O + CO2 → H2CO3
H2O + SO2 → H2SO3
, onde duas moléculas de três átomos formam uma mais complexa de seis e em nenhuma outra combinação a não ser sob condições extremas de energia, logo, as moléculas podem perfeitamente tender a complexação, além de não reagirem pela aleatoriedade, e sim, por mecanismos de reação química específicos.
E por favor (pegaram o tom?), se criacionistas acham que o caso acima é uma anomalia dentro da química, peguem o caso banal de
H2O + SO3 → H2SO4
alterando o número de átomos envolvidos, mas não o crescendo de complexidade do produto.
Ou das inúmeras polimerizações, como a do ácido adípico com a hexametilendiamina, produzindo nylon, aliás, intimamente relacionada com a síntese de proteínas, ou do ácido tereftálico e o etileno glicol, produzindo o PET de nossas garrafas de refrigerante. Aqui, se eu quisesse e não considerasse um total e completo desperdício até do tempo de quem me lê, poderia jogar quase a obra clássica inteira iniciada por Fieser, já em 23 volumes nesta edição, ou o site Organic Synthesis.
Resumindo, moléculas geram complexidade por si, doa ao amador em química em esperneio insano que seja.

“Princípio Vital”

Criacionistas volta e meia, mesmo sem ter específica cultura para isso*, apelam para o “princípio vital”, morto e enterrado desde a síntese da uréia, em 1828, a partir do aquecimento do cianato de amônio, inorgânico,
NH4(OCN) → CO (NH2)2
logo, do inorgânico surge o orgânico, e portanto, do inorgânico surge o bioquímico. Mas criacionistas retornam repetidamente a este argumento pífio, morto e enterrado em química, mesmo sem se necessitar chegar a questões mais complexas de síntese orgânica.
Para os que não conhecem a história desta questão, o que seja “princípio vital” era um dogma em Filosofia Natural, e até nos primórdios da química, que substâncias inorgânicas jamais poderiam produzir as substâncias que a vida utiliza, como aminoácidos, por exemplo, e mesmo subprodutos dos processos biológicos.
*Ver abaixo A questão do nível de linguagem e cultura específica.
Caudas de golfinhos, asas de águia, visão de toupeiras.

Criacionistas seguidamente colocam o “acaso” como responsável pela, digamos, cauda de um golfinho, como se assim o fosse sua origem, e mesmo esquecendo os séculos de passos deste processo, desprezam o mais que perceptível e indiscutível processo inexorável em permanente marcha que é a seleção natural, ou considerariam que um “urso” (no famoso pequeno erro de Darwin, ou um ungulado carnívoro, no nosso posterior desenvolvimento desta questão) ganharia uma cauda nadadora por milagre ou poderia nadar eficientemente sem esta no oceano?
Embora, mais uma vez, cuidado, pois ursos polares estão entre os melhores nadadores entre os animais terrestres, o que lembra o permanente problema dos criacionistas que acham que um orgão ou sistema para funcionar tem de ser perfeitamente adaptado ou um parcial não possa desempenhar determinadas funções.
Assim, primeiro colocam um processo aleatório onde ele não existe, depois, consideram que a forma tem de ser absolutamente fixa, e não poder se modificar, e em cima disto, afirmam que mesmo se modificando, uma cauda não plena como nadadora não poderia funcionar bem (embora, percebamos, para nadar bem, as patas fofas dos ursos polares funcionem bem), desprezando que a natureza apresenta nos inúmeros filos os mais diversos estágios parciais de desenvolvimento de diversas estruturas – só para ficar no ambiente aquático – como as caudas das lontras, das focas e dos leões marinhos, dos peixes-bois, num caminho próximo dos cetáceos, ou as asas dos avestruzes (sem falar nas capacidades apenas de planeio das galinhas e dos curtos vôos dos perus selvagens) e mesmo de aves sem asa alguma, como as extintas “aves elefantes” ou os atuaisquivis, para citar outra estrutura sobre as quais tem verdadeira obsessão. Aqui, nesta questão, percebo uma aplicação de “paradoxo sorites” pela parte dos criacionistas, sempre na sua forma de falácia, ou seja: asa ou cauda nadadora é só aquilo que seja plena e absolutamente uma asa ou cauda nadadora, nada menos.
Biologias alternativas e genéticas exóticas
Criacionistas adoram afirmações retumbantes que não resistem a menor pesquisa mesmo por leigos, ou não sobrevivem à análise pelo próprio nível de ensino no qual afirmam que esta ou aquela afirmação científica é sólida, como “aprendemos no ginasial que mutantes não sobrevivem”. Engraçado, que tendo uma mutação que produz uma alteração na forma dos meus dentes molares chamada Tubérculo de Carabelli* e ao que parece, estou aqui, muito vivo.
*E notemos que modificações como estas levaram primeiro à formação de dentes diferenciados nos sinapsídeos, como o dimetrodon, cujo nome significa exatamente aquele que possui dois tamanhos destacados de dentes, em sua separação dos demais amniotas, como os répteis, que possuem indiferenciação de dentes, basta olhar um crocodilo.
Também como contra-exemplo marcante de que mutações não implicam em morte, temos os vírus e bactérias, que exatamente quando apresentam mutações que lhe sejam favoráveis, tornam-se ainda mais nocivos e letais aos seres humanos ou nossos animais e plantas (ou a qualquer ser vivo, fique bem claro), e exatamente quando sofremos (ou qualquer ser vivo) mutações que nos tornem a eles imunes ou pelo menos mais resistentes, sobrevivemos.
Ainda mais “pérola”, como nos acostumamos a dizer entre os debatedores de determinados círculos sobre evolução, é afirmarem que as modificações adquiridas não são transmitidas às gerações seguintes, quando exatamente as modificações adquiridas na genética são as transmitidas. Logo, se uma modificação como os tubérculos em meus molares passou de meu pai a mim, poderia receber uma nova mutação em minha genética, e se das células repodutivas, passar a um filho meu, agora com tubérculos em meus caninos (só para citar uma possibilidade).
Logo, não basta ao criacionista fazer afirmações que não se sustentam ao mínimo em observações simples sobre as diversas mutações humanas, sem falar de qualquer animal ou planta doméstica, como são as clássicas entre os estudantes de secundário patas curtas em ovelhas e os “umbigos” das laranjas, mas também colocar afirmações lamarckistas (que como negativas são sólidas) como se fossem afirmações da teoria sintética da evolução, que não só é darwinista como também é estruturada na genética.
Genética fixa quando nos é conveniente,
genética inexistente quando nos é inadequada

Aqui apresentarei como exemplo uma argumentação de comentário infeliz de um criacionista a comentário meu ao seu conjunto de pseudo-argumentos. Este criacionista pergunta em desafio como que a primeira aranha que produziu a teia com a viscosidade certa* transmitiu esta capacidade à geração seguinte. Aqui já se demonstra um conhecimento um tanto distorcido sobre genética, pois me parece até óbvio que basta se olhar para nossos cabelos e olhos no espelho e ver que os herdamos de nossos pais. (A questão não passa só por esta banalidade genética, mas sim, pelo que apresentarei após tratar esta argumentação sobre aranhas.)
*Primeiro, conhecendo um minimo de aranhas, e um tanto de química, dizem por aí, teria de perguntar proteína de teia para qual finalidade, pois temos aranhas que produzem desde capas para suas armadilhas no solo até as grandes “tecelãs de jardim”, com suas “rendas complexas” e inclusive aranhas que não produzem teia estrutural alguma.
Independentemente de criacionistas apelarem para um fixismo que não se sustenta**, aqui apelam para que não existam na natureza aranhas que não produzam teia complexa, e sobrevivam de maneira perfeita, como as domésticas aranhas “papa-moscas“, saltadoras, que são admiráveis em predar insetos, indo a caça sem espreitar que alguma presa fique presa seja lá no que for. Logo, é gritante que produzir teia não implica em sobreviver, logo, poderiam aranhas terem crescentemente produzido teias mais e mais aptas para caçar (ou mesmo, paradoxalmente ao argumento criacionista, terem abandonado a produção de teias para caçar como inúmeros outros artrópodes e até mesmo aranhas) geração após geração.
**Inclusive entre eles, como seguidamente repito pela própria necessidade de para sustentar o dilúvio bíblico, terem de se dobrar a evolução dentro de filos estanques, os espúrios “baramins”, e mesmo dentro destes, relutarem com determinadas estanqueidades que apresentam mas não existem, como entre raposas, coiotes, lobos e cães, ou entre os felinos, apenas para citar grupos destacados. Aqui, por exemplo, apelam para o mesmo em artrópodes, e apelariam genericamente para qualquer filo que se apresente continuidade – descendência – no tempo, relutando em cada caso apenas em buscar sustentar finalmente o fixismo, logo, criação.
Um acréscimo, com mais caos ao mundinho perfeito e exato dos criacionistas

Pelo quadro da ausência de evidência de teleologia visto em O eterno retorno da Falácia de Hoyle e pela questão de combinatória como realmente deve ser tratada em Números misteriosos ou incompreendidos, vejo-me obrigado a alongar estas questões, agoras mescladas.
Criacionistas querem que o processo evolutivo seja obrigoriamente determinista, pois determinista foi a afirmada ação de sua divindade (aliás, determinista TEM DE SER uma divindade, ainda mais a bíblica). Defensores do Design Inteligente igualmente, pois pela sua argumentação, nada mais determinista que os arranjos moleculares que geram a complexidade que afirmam irredutível.
Infelizmente para ambos, apenas consideramos o processo evolutivo dos seres vivos indeterminista, num sentido mais trivial, em seus motores mais profundos, que são aleatórios*, ainda que sua variabilidade possível apresente limites.
*Pois quânticos, como por exemplo, a ação das radiações nas mutações.
Estes limites são claros pois evidentemente dos ovos de um colibri não nascem modificações destes em algo similar à uma águia, mas apenas colibris diferentes de seus pais e nem mesmo uma gata dá a luz a um tigre dente-de-sabre, mas pelo acúmulo de modificações, um colibri poderá ser o ancestral de uma ave tão poderosa quanto uma águia, e ainda mais facilmente uma gata poderá ser a ancestral de um felino de grande porte com enormes caninos.
Devemos observar que esta ave poderá ser extremamente parecida com um águia, assim como o felino de grandes caninos poderá ser quase idêntico a um pré-histórico tigre dente-de-sabre, mas estes hipotéticos animais não serão nem uma águia nem um Smilodon, pois estes evoluíram de outra ave e outro felino que não foram nem um colibri, nem um gato doméstico.
A evolução é um jogo cujas etapas podem se repetir em processos e regras, mas cada etapa depende da etapa anterior e é única em suas combinações.

Então a aleatoriedade opera dentro de limites, e causa bifurcações específicas nos cladogamas, as especiações, e estas são “peneiradas” de maneira determinante pela seleção natural.
E mesmo esta seleção tem em sua ação a aleatoriedadede do ambiente, que é aleatório nos processos astrofísicos, e mais ainda nos geologismos, pois a deriva continental é o maior motor da modificação dos ambientes terrestres.
Por fim, concluímos que a evolução é sob amplo aspecto indeterminística, mas em seu indeterminismo, converge com o ambiente para determinar exatamente as espécies que sobrevivem em cada período de tempo de cada ambiente geográfico (e até geológico) da história da vida na Terra.
A questão do nível de linguagem e cultura específica
(Poderia chamar este pequeno capítulo de “A origem dos meus ‘HAJA!’ “)

Percebamos a primariedade do argumento criacionista acima, e aqui repetirei um post no ORKUT que escrevi há anos, e infelizmente, se perdeu, e julgo agora adequado reescrevê-lo.
Na minha biblioteca, possuo dois livros chamados Advanced Organic Synthesis, um com o subtítulo Methods and Techniques, de Richard Monson e outro com o subtítulo Reaction and Synthesis, de Francis Carey e de Richard Sundberg. Para se ter uma visão do que e trata o que define-se por estes títulos como “síntese orgânica avançada”, seria recomendável passar os olhos por esta versão em pdf: Monson
Estas obras são escritas numa linguagem, hora específica e técnica, hora resumida e abreviada a extremos, que é praticamente ininteligível a não ser para aqueles profissionais de alguma vivência em síntese orgânica, que não só é a ciência e a técnica de se obter substâncias orgânicas, molecularmente falando, a partir de outras substâncias, sejam orgânicas ou não, por intermédio de reações químicas e processos físico-químicos (como aquecimentos a determinadas temperaturas e durante deerminados tempos). Afirmo ‘não só’ pois muitas sínteses possuem um tanto de arte, de técnicas que são empiricamente desenvolvidas, pois alguns passos e detalhes não possuem modelo algum que os trate, e inclusive, algumas ainda nem possuem uma explicação teórica (um exemplo que sempre cito é o ácido antranílico a partir do orto-nitrotolueno por oxi-redução interna - notemos que só esta linha já dá uma amostra do que quero afirmar neste parágrafo).
Não significa que a síntese orgânica avançada seja um campo transcendente, superior a qualquer outro, mas sim, que exatamente como inúmeros outros campos avançados em diversas ciências, é apenas inteligível em linguagem por quem possui já uma significativa experiência em tal campo, vivência e aprendizado em um nível superior.
Aqui entra a questão que quero afirmar: criacionistas, mesmo sem formação, experiência ou mesmo nível de linguagem, mesmo quando a possuem em outros campos, como são os casos destacados de Duane Gish e Michael Behe, curiosamente ambos bioquímicos, o primeiro um criacionista de “Terra Jovem”, biblicista, e o segundo um dos principais defensores do design inteligente (e aqui vale ler meu artigo de porque o D.I. é um criacionismo), não entendendo coisa alguma claramente de termodinâmica ou física nuclear acima de um determinado nível, ou bacteriologia e fisiologia do olho (sendo específico), respectivamente, fazerem ataques a um volume colossal de informação científica, inclusive por especialistas de renome maior que eles próprios em seus próprios campos de especialização e formação.
O que devemos dizer então de criacionistas sem a menor formação acadêmica em campo científico algum, a escrever volume enorme de coisa alguma sobre questões que não são difíceis de serem rebatidas por um estudante de secundário?
Ou ainda sim, quererem discutir sobre campos mesmo com pessoas com formação específica e robusta, quando não longa experiência nestas questões, sem nem se necessitar falar de biólogos e paleontólogos, mas por exemplo, químicos e engenheiros químicos, como é o meu caso, com formação tanto em termodinâmica num nível técnico bastante sofisticado, ou síntese orgância, com larga experiência acadêmica e profissional?
Voltemos aqui as duas questões acima: quem convence alguém com a Bíblia como resposta par questões científicas, quando nem mesmo neste campo seus dois primeiros livros escapam inclusive de contradições mútuas? Ou quem conseguirá provar-me que criacionismo não passa por um tanto de masoquismo a cercar um fundamentalismo patológico (como se algum não fosse)?
Responder a pergunta acima deveria ser tão banal quanto os criacionistas, dos mais diversos tipos, ao invés de ficarem perdendo seu tempo esmurrando o colosso intelectual que é a Biologia e sua inseparável “Teoria Eixo”, simplesmente comprovar os fenômenos miraculosos que afirmam.

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